8 – Da Física para a Metafísica
A teoria da evolução prega a origem humana
vinda do macaco. Este é classificado primata, como nós. Macacos e seus próximos
como chimpanzés vivem em pequenos grupos, comandados pelo macho alfa. Existe
uma política para o posto de macho alfa com traços semelhantes a política
humana. O macho alfa só consegue manter a harmonia social de cerca de uma
dezena de seus pares ou um pouco mais. Grupos maiores geram brigas internas,
quebram a ordem social e se dividem em grupos menores.
Da mesma forma que os animais, os
primeiros humanos viviam em pequenos grupos, pois grupos grandes
desestabilizavam a ordem social. Depois, houve outro aumento de membros de
grupos em razão da revolução social. A prosa em torno da fogueira permitiu este
aumento com a fofoca (conversa é metafísica) chegando a cerca de uma centena de
indivíduos. Organizações maiores não eram possíveis, pois era difícil comandar,
evitar brigas e rachas.
O sapiens superou este limite físico com o
surgimento do animismo (mitologia, metafísica). Nossos antepassados podiam
colaborar acreditando na mesma mitologia. A colaboração humana de grupos
maiores se funda em mitos compartilhados que não existe fisicamente, mas só
mente das pessoas. As religiões, estados, empresas, sistema jurídicos se fundam
em imaginações compartilhados. O estado brasileiro, a religião católica, a
empresa Fiat são produtos de nossa imaginação coletiva, uma ficção jurídica e
religiosa. Estes não são um objeto físico, mas são construções sociais,
realidades imaginadas e existem apenas em nossa mente.
Em seguida, houve um limiar que
historiadores e pesquisadores vão chamar a Revolução Cognitiva, mas nós vamos
chamar de Revolução Metafísica. O conceito de física e nosso conceito de
metafísica vai colocar a cognição (memória, comunicação, aprendizado) dentro do
conceito de metafísica. Os 3 atributos citados não possuem substância e diluem
o tempo físico. Tanto a memória como o aprendizado e a comunicação podem ir no
futuro e no passado instantaneamente. A física trabalha com o tempo linear. Uma
flecha não volta no tempo depois de atirada.
Antes, o homem nômade era caçador-coletor
e vivia em pequenos grupos isolados. Ele passou a manipular o mundo vegetal e a
adestrar o mundo animal, virou sedentário o que permitiu aumento significativo
de membros. Ele fundou cidades e depois nações e foi para o topo da evolução da
vida. A evolução humana é exponencial. A existência das primeiras espécies humanas
tem milhões de anos. A revolução industrial tem cerca de 2 séculos e vivemos em
plena revolução informacional. Antes, a evolução era biológica, agora é mental,
metafísica. Evolução biológica necessita de milhares de anos para uma mutação.
Não existe uma explicação biológica para a revolução social. A convivência de
grandes sociedades não é um imperativo biológico, mas metafísico. Historiadores
como Noah, vão relacionar a cooperação em massa com mitos partilhados. A
humanidade inventa histórias como mitologia, nação, empresas para evolução
social. A ordem social com base em leis, ética e religiões se deve a metafísica
e não a lenta evolução biológica.
O primeiro código escrito é o de Hamurabi.
Ele estabelece a ordem social para fazer justiça com base em deuses. Estes
apoiavam Hamurabi para ser o governante do povo. Assim, uma ordem superior
governava a ordem social. Similarmente, a declaração de independência americana
prega um deus americano e direitos humanos alienáveis. Da mesma forma, a lei
maior do Brasil tem inspiração divina. Vejam o preâmbulo da constituição
brasileira:
“Nós, representantes do povo brasileiro,
reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado
Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade
e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e
internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a
proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”
A constituição brasileira afirma, sem
procuração, estar sob a proteção de Deus. Ela e o código de Hamurabi
estabelecem leis para preservar a ordem social, com base numa ordem maior.
Assim, todos acreditam ter as leis princípios maiores. O rol de direitos
defendidos no preâmbulo pode ser sintetizado apenas em 3 direitos: existência,
liberdade e igualdade. Existência é o direito à vida. No Brasil, a vida é um
direito absoluto. Poucos países implantam a pena de morte pelo mundo. Este
direito é fácil de entender. Já os direitos a liberdade e igualdade são
aparentemente fáceis de falar e escrever, mas são profundos, muitas vezes
difíceis de identificar e, principalmente, difíceis de conciliar.
O cristianismo prega a existência da alma
humana de origem divina e todas seriam iguais. A biologia pensa diferente em
termos de evolução, liberdade e igualdade. A vida não foi criada, mas evoluída.
Não existe liberdade e nem igualdade. A seleção natural vai privilegiar o mais
forte ou o mais habilidoso. A biologia também nega a existência da liberdade,
pois a biologia ignora a ordem social. Hoje, sabemos que a ordem social defende
o mais fraco do mais forte. Fragilidades humanas como as doenças são combatidas
pela saúde pública. Uma ordem social busca estabilidade com polícia, justiça e
ideais políticos como igualdade e liberdade.
A revolução francesa, em 1789, defendeu
uma trindade de valores ideais: liberdade, igualdade e fraternidade. Ela
inspirou a declaração universal dos direitos humanos, proclamada pela
assembleia da ONU em 1948. Em seu artigo primeiro, ela diz: “Todos os seres
humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e
consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de
fraternidade.” A fraternidade não chega a ser um mandamento legal, mas
liberdade e igualdade são mandamentos legais. Eles são repetidos inúmeras vezes
ao longo da declaração.
Desde então, a ordem política vê a
igualdade e a liberdade como valores fundamentais, mas estes valores ainda são
contraditórios. A elevação do valor igualdade tende a diminuir as liberdades e
vice-versa. Desde a declaração dos direitos humanos, a política busca superar
esta contradição. No Brasil, a política contemporânea gira em torno da
polarização Bolsonaro e Lula, representantes do capitalismo x o socialismo. Se
você brasileiro não escolher um deles, a culpa é sua do país não ser melhor. As
pessoas confundem ideal com pessoal e os eleitores deles acreditam que os 2
líderes são salvadores da direita e da esquerda.
A política americana vive também em torno
desta contradição. Os democratas são de viés socialista e querem mais igualdade
social. Porém, isto restringe a liberdade financeira de gastar como quiser,
pois implica em aumento de impostos para assistência social de pobres e
enfermos. Os republicanos querem liberdade para consumir seu dinheiro como
quiserem, mas isto implica em desigualdade social e de renda.
Na prática, a ideologia de esquerda
privilegia uma pequena elite com riqueza e iguala todos na pobreza. A ideologia
de direita gera riqueza, mas gera ricos e um grande consumismo estéril. A
riqueza deve ser para todos, mas apenas para a sua evolução e não para um
consumismo desenfreado que levaria a destruição do planeta.
Os ideais de existência, liberdade e
igualdade são metafísicos e buscam a unificação da humanidade. Eles habituaram
as pessoas a pensar e viver de forma igual, seguindo padrões e regras, chamado
de cultura. Esta não é produto de evolução, não é um instinto biológico, mas de
uma ordem imaginada. A cultura humana compartilha o mesmo sistema geopolítico
planetário. Nenhum país vive isolado e a crise de um deles pode afetar todos os
outros. Não conseguimos conciliar os valores filosóficos de liberdade e igualdade.
Este dilema gera conflitos e tensões em todas as culturas.
O paradigma da humanidade é ainda o
paradigma de física. Para a física, a realidade é matéria-tempo-espaço, algo
material no tempo espaço. Precisamos de um novo paradigma. Logo, vamos fazer
uma abordagem racionalista. Nós vamos propor uma alternativa, nossa realidade é
metafisica, sem matéria, sem tempo e espaço. Semelhantemente, a matemática
também tem os valores fundamentais de liberdade e igualdade e tem problema
existencial de seus objetos. A matemática é uma ordem metafísica e funciona de
modo preciso com estes dois valores. A humanidade precisa entender a sua
existência frente aos valores fundamentais liberdade e igualdade.
Há muito tempo, o homem busca explicações
para a existência. Primeiro foram as narrativas mitológicas, em seguida as
religiões com base em narrativas míticas. Modernamente, a ciência com base em
seu método empirista tenta explicar o universo e a vida como algo no
tempo-espaço. Estas searas do conhecimento promoveram um embate, mas as
questões existenciais permanecem. De onde viemos e o que somos nós? O homem não
quer só comida. Há milênios religiosos, filósofos, poetas e cientistas tentam
responder estes enigmas da existência. No entanto, ainda não há uma resposta
satisfatória.
O homem, em alguma fase de sua existência,
faz as perguntas existenciais. Elas são denominadas questões existenciais por
referir à vida e a sua existência. Os
mitos foram os primeiros a responder tais questionamentos. Em regra, eles
buscavam explicar o mundo físico através do mundo metafísico. O mundo físico é
constituído de homens e o mundo metafísico é constituído de deuses que
interferem no mundo físico.
A diversidade de mitos para explicar o
mesmo mundo metafisico pode e deve ser questionada, pois os mitos é uma forma
infantil de explicar a realidade metafisica. Mas, o mundo metafisico está em
todas as culturas e povos. Assim, ele é universal e não deve ser negado. Os
mitos de todos os povos e culturas sempre têm o mesmo conteúdo e forma
narrativa. Apenas mudam os personagens e o contexto. A criação dos deuses, a
criação do mundo, do homem e a relação conturbada entre homens e deuses. O
mundo metafísico é universal e não deve ser negado.
As religiões apropriaram dos mitos e
passaram a exercer poder sobre o mundo dos homens e do mundo metafísico. Com o
tempo, a igreja transformou os deuses em santos. Estes personagens adotaram os
poderes e qualidades daqueles. Os deuses pagãos eram bonitos, fortes e detinham
superpoderes e influenciavam seus adoradores. Eles também inspiraram
personagens bíblicos, os super-heróis da TV, das HQs, da Literatura. Também
inspiraram os ídolos do esporte, música e cinema, sempre bonitos, fortes,
saudáveis. Estes mitos modernos também influenciam seus fãs na moda,
alimentação, lugares.
O homem tem necessidade de saber sua
origem. Causa e efeito é um princípio cósmico inerente a vida e o universo.
Entretanto, os pensamentos atuais e históricos não apresentam soluções, mas
divisões. A física vai dizer que a nossa origem é única e o tudo veio com o Big
Bang. Antes, existia o Nada. As religiões monoteístas também vão dizer que
nossa origem é única, mas que viemos de Deus. Ambas pregam origem única, mas
divergem quanto a causa primaria. Enquanto uma prega uma inteligência como
causa primária, a outra prega o Nada e o Acaso como causas primárias. Isto
gerou uma discussão filosófica-cientifica sobre a origem da vida: acidente ou
design?
Nesta esteira, o conhecimento hodierno
pode ser dividido entre os pensamentos físico e metafísico. O pensamento
puramente físico ficou a cargo da ciência e o metafísico a cargo das religiões.
Hodiernamente, a filosofia segue a ciência e se distancia da metafísica. A arte
não possui um próprio conhecimento elaborado e se diverte com todos os
pensamentos.
A ciência nega o pensamento metafísico. As
variáveis da ciência na busca pela origem da vida são: matéria, energia, lei
natural, irregularidades naturais, processo do acaso. Não se pode usar mente ou
inteligência para explicar a natureza.
Este pensamento ficou conhecido como materialismo científico. A vida
seria uma evolução química cega. Uma química natural seria a explicação para a
vida baseada no acaso. Porém, estatisticamente não existe possibilidade de o
acaso ser o instrumento criador da vida. Nem mesmo teorias biológicas como a
seleção natural e auto-organização não conseguem explicar a existência.
A ciência busca descrever a natureza e daí
resulta o princípio natural. Ou seja, a ciência busca verdades em processos
naturais. Com isto, ela quer dizer que o sobrenatural não interfere na
natureza. Neste aspecto, a ciência tem razão. Realmente, mito e religiões
exageraram em narrativas de intervenções divinas diretas na vida das pessoas.
Até hoje, as pessoas rezam para seu time de futebol ganhar uma partida ou um
campeonato e agradecem a um deus. Uma ordem superior não poderia admitir uma
intervenção cósmica na vida das pessoas, pois a existência deve ser perfeita e
não precisa de reparos ou emendas.
Esta mesma ciência dividiu o conhecimento
em objeto e sujeito. Sócrates centrou no sujeito, buscava o autoconhecimento, o
“conheça-te a ti mesmo”. Descartes também pregava o autoconhecimento a partir
do sujeito: “Penso, logo existo”. Para
eles, a filosofia deveria começar pelo sujeito. A revolução industrial, o
positivismo, o pragmatismo levaram o pensamento para o objeto, para as coisas
materiais e o consumismo extremo. O existencialismo ateu em nada ajudou o
estudo do sujeito. O idealismo perde força para o realismo. A vida passa a ser
vista como uma máquina.
Em sintonia com o materialismo, a teoria
da evolução unificou mente e corpo e enfatizou a luta pela sobrevivência.
Inspirou pensamentos materialistas e pragmáticos. Positivistas passaram a
pregar a vida em termos biológicos e não metafísicos. O pensamento pragmático busca resultados,
utiliza objetos e tecnologia para isto. O utilitarismo avalia os bens pelos
números de usos. A teoria de Darwin enfatiza a luta pela vida, o mais apto é
quem sobrevive. Mecanicistas acreditam em apenas uma base mecânica e material
de todo evento e descartam a mente.
Para a biologia, a vida é uma máquina
biológica. Ela é comandada pelo cérebro, genes e hormônios. Não existe uma alma
conectada ao corpo. Não existe um espírito por trás da matéria. Não existe a
metafísica. A vida é apenas uma máquina
comandada pelo cérebro. Este é visto como usina de energia, uma máquina
elétrica e química. Após o estudo de comportamentos diversos, observa-se a
atividade elétrica dos neurônios. Vale dizer, estudar o cérebro pela neurologia
é implantar eletrodos na cabeça humana e mapear o cérebro, conforme registre
atividade elétrica em comportamentos produzidos.
Como a ciência nega o mundo metafísico,
uma resposta da química para a vida poderia ser assim: somos a reunião de 55%
de água, 23% de carbono, 2,6% de nitrogênio, 1,4% de cálcio e 0,8 de outros
elementos. A biologia poderia responder assim: somos 10 trilhões de células e
mais outros 100 trilhões de seres estranhos a nós (bactérias, vírus). A física
poderia dizer: somos um grande vazio, pois a eletrosfera do átomo é 100.000
vezes maior que seu núcleo. A biofísica poderia também dizer: somos sinais
elétricos que enviam informações dos sentidos ao cérebro. A astrofísica diria:
somos poeiras estrelar.
Vida, para a ciência, é mais fácil
identificar do que definir. Não existe uma definição de vida universalmente
aceita pelos cientistas. Há apenas algumas características como reprodução,
sobrevivência. Cientistas gostam de ver a vida como reações químicas. Amor
seria apenas uma reação bioquímica para perpetuar genes. A biologia seria uma
química viva. Entretanto, eles não sabem como é esta passagem da química para a
biologia.
Para o cientificismo, a vida também
estaria relacionada com eletricidade. Átomos e moléculas interagem
eletricamente entre si. Forças químicas e físicas seriam responsáveis pela
vida. Esta é uma perspectiva científica
e mecanicista da vida. Mas, e a consciência? A ciência também não tem uma boa
resposta, mas também reduz ao materialismo. O cinema pegou carona na onda
científica e deu “consciência” às maquinas e um sem fim cinematográfico:
Robocop, O Exterminador do Futuro, O Homem Bicentenário, Blade Runner, Chapie,
Eu Robô, entre outros.
Esta ideia do homem como máquina o
desumaniza e prejudica o pensamento da humanidade. Prejudica a busca pelo bem e
o afastamento do mal. Prejudica a busca do ideal. As massas acabam por buscar a
fé cega. A filosofia perdeu autonomia e segue a ciência. Porém, o verdadeiro
filósofo busca a identidade, o “Eu” para a vida e pergunta: onde está o “Eu”?
No cérebro, alguns dirão, mas especificamente na glândula pineal. Muito se
discute sobre a função desta glândula, mas ela está ligada ao sono. Descartes
afirma ser tal glândula o ponto de contato entre a alma e o corpo, assim com
uma função transcendente.
Somos únicos, sem igual. Cada um de nós é
único. Biologicamente, somos únicos, pois nossas digitais localizadas nas
pontas dos dedos são únicas, pois não existem digitais iguais. Também nossas
íris de nossos olhos são únicas. A probabilidade de encontrar íris iguais em
seres humanos diferentes é praticamente 0. Também temos DNA único.
Psicologicamente, somos únicos. Nem mesmos
os gêmeos univitelinos ou idênticos têm a mesma personalidade. Apesar de
partilharem precisamente o mesmo DNA, estudos sugerem que os gêmeos idênticos
podem apresentar personalidades completamente diferentes, ainda que criados na
mesma família.
Socialmente, também somos únicos. Nós
temos nomes, sobrenomes apelidos que vão nos diferenciar um do outro. No
entanto, acontece de encontrar nomes iguais entre pessoas diferentes, mas
possuímos diversos documentos que nos identificam sem iguais e usam a
matemática, números, para nos diferenciar. Carteira de identidade, registro
geral, CPF, passaporte são documentos emitidos pelos governos para confirmar a
identificação das pessoas. Nestes são registrados os dados pessoais, como nome,
data de nascimento, sexo, filiação, impressão digital, foto e assinatura com um
número de identificação que vão reconhecer o cidadão.
Além da unidade de identidade física,
psicológica e social, a modernidade nos brindou com a identidade digital. O
usuário eletrônico tem a liberdade de escolher um nome digital (login) e um
endereço digital (e-mail). Notem que este mundo digital também é um mundo
metafísico, sem substância ou matéria. O sistema binário utilizado pela
eletrônica ora detecta uma corrente elétrica, ora detecta o nada para produzir
palavras, números, imagens, sons, filmes, fotografias, gráficos, entre outros.
A pergunta “quem sou eu?” não chega a ser
existencial, pois temos nome, endereço, número, profissão que nos identificam.
A questão existencial é “o que somos nós?”
A ciência nunca terá uma resposta para o
que sou eu, o que é a vida, quando começa e termina. Nunca responderão porque a
matéria inorgânica se tornou-se orgânica. Nunca responderão o que é a
consciência, pois estas searas não pertencem aos seus estudos e sim ao campo
metafísico. Toda vez que a ciência tenta explicar materialmente o mundo
metafísico, ela fica em uma sinuca de bico.
A neurobiologia tenta subordinar todas
ciências e a filosofia a seu paradigma. A biologia tenta subordinar as ciências
humanas e sociais a seu paradigma. A física tenta subordinar a química e todas
as outras ciências a seu paradigma, pois acredita (ela também tem fé) que seu
trabalho com os elementos fundamentais da matéria pode identificar padrões e
prever evoluções de qualquer sistema.
Entretanto, a neurobiologia não sabe dizer
o que é a consciência e não acessa seu conteúdo. A biologia não sabe dizer o
que é a vida e como a matéria inorgânica tornou-se orgânica. A física não sabe
explicar a natureza da matemática e nem a sua eficiência em representar a
realidade material. Tais questões são da natureza metafísica e sem solução
material. A abordagem científica e sua quantificação é um fantástico
instrumento do conhecimento. Mas, negar outras formas de conhecimento, negar o
pensamento racional, negar o mundo metafisico é ignorância.
Fazendo contraponto a ideologia da
ciência, críticos chamam de cientificismo esta crença excessiva no método
científico. Este neologismo é utilizado para criticar o reducionismo e excessos
científicos. Ela é uma palavra pejorativa usada por filósofos e humanistas para
criticar algumas ciências como a física, a biologia, a neurologia que acreditam
reduzir tudo a sua ciência. Tais ciências desumanizam as pessoas ao tentar
reduzir tudo a átomos, a células e a sinais elétricos do cérebro.
O objeto de estudo da ciência é o todo, a
totalidade da realidade, compreender todo o universo. Mas a ciência nega o
mundo metafísico. Apesar de ser, digamos, embaçado este universo metafísico, as
religiões o pregaram em todos os tempos e espaços. Assim, podemos dizer que ele
é universal, pois existe em todos os tempos e lugares. Ele sendo universal, não
estaria a ciência negando a realidade?
A ciência, então, não estuda o todo. Por
que ela não estuda o todo? Porque o método científico é voltado para o exterior
do mundo e não para o interior do sujeito. A própria ciência dividiu a
realidade em sujeito e objeto: aquele que conhece e aquilo que é conhecido. O
objeto de estudo da ciência segue o paradigma da física, é a matéria no
tempo-espaço. O método empírico científico busca o conhecimento do mundo físico
e exterior, mas não do mundo interior, o mundo metafísico.
Neste sentido, a psicologia baseou
equivocadamente no método científico ao estudar a psique, a alma, o “eu” ou
sujeito do conhecimento. Embora Sócrates dissesse há quase 2.500 anos
“conheça-te a ti mesmo”, assim com ênfase pleonástica no “eu”, a humanidade não
resolveu a questão existencial. A observação do mundo exterior tem a autoridade
da ciência. Todavia, o mundo interior não está nos sentidos, no sistema nervoso
e nem mesmo no cérebro. Imagine um carro: ele tem vários sistemas: de freio, de
aceleração, de energia, refrigeração, segurança. Mas quem comanda ele, tenha
ele uma central de computador ou não, é o homem. É algo externo a ele que é
apenas um instrumento. Da mesma forma, o corpo é apenas um instrumento a
serviço do “eu”, do espírito ou qualquer nome que o leitor quiser dar.
Tanto a biologia quanto a física pregam
forças cegas no comando do corpo e do universo. A vida não pode ser um mero
acidente, uma série de acasos como quer a ciência. Nada faz sentido se não
fomos planejados e com um universo sem propósito. Há um propósito cósmico de
integração no universo. As perguntas existenciais ainda continuam para
filósofos, cientistas, artistas e religiosos. Eles continuam tentando explicar
o enigma da existência.
Na esteira das forças cegas, a ciência
apresenta uma versão conhecida como “Universo Acidental” ou “Universo Absurdo”,
o universo é um acidente, a vida é um acidente, e não existe um objetivo
consciente por trás do que ocorre no mundo. Existimos em um cosmo sem objetivo,
frutos de forças brutas e somos um evento raro e não um ato premeditado.
Porém, se estamos ou não vivendo uma
grande realidade simulada é uma pergunta a qual a ciência não pode dar uma boa
resposta. É possível que esta realidade material seja uma grande ilusão. Na
verdade, esta é uma questão filosófica clássica. Ou seja, a Matrix é aqui. O
universo menos palpável não nos é estranho. Com a linguagem, podemos nos
referir a fatos, objetos ausente, passados, futuros, hipotéticos e mesmo
abstratos. Com a matemática, podemos criar mentalmente antes de realizamos
materialmente.
Quando falamos, estamos criando em nossa
mente uma outra realidade. A realidade virtual, paralela, metafísica e ao mesmo
tempo longe da real. Todos percebem o mundo biologicamente da mesma maneira.
Entretanto, cada indivíduo tem um sistema particular de valores. O mundo que
acreditamos viver é um simulacro do real que passa pelos filtros biológico e
ideológico. Esse mundo que existe na mente do homem (universo paralelo) criado
pela linguagem. Isto é o que chamamos de visão do mundo.
A ciência se diz empirista (materialista),
vale dizer, para existir tem que ser possível ver, cheirar, degustar, ouvir ou
tatear o objeto de estudo. Como fazer isto com as leis de newton? Como cheirar,
tatear ou ouvir a matemática? Em verdade, tais leis têm que ser processadas
pela mente, uma entidade metafísica. Então, tanto a matemática como as leis
físicas são leis metafísicas. Nossa origem é metafísica, nossa natureza é
metafísica como a linguagem e a matemática são metafísicas.
Da mesma forma leviana, cientistas
atribuem determinados fenômenos religiosos a sentimentos e sensações, como o
medo, a imaginação, a alucinação mesmo sem evidências empíricas. Mas atribuir o
medo e a superstição como origem de todas as religiões, em todos os tempos e
espaços, seriam negar o que é universal, seria negar a realidade. O medo não
pode afetar a todos, o tempo todo em todos os cantos. Este “erro” universal não
será provado como origem das religiões em todos os tempos e espaços. A
transcendência é inata, está em todos seres humanos e em todos os tempos e
espaços. A alternância entre os mundos físico e metafísico explica a
espiritualidade e não o medo.
Entretanto, o ensino religioso atual é o
mesmo pensamento mitológico de milênios atrás. As teologias vencidas ainda
reinam em pleno século XXI, convivendo com modernas tecnologias. Dogmas não
permitem sua evolução e isto levou a ciência a ridicularizar o pensamento
religioso. As infantis teologias apropriaram do metafísico, mas seu pensamento
está vencido.
Primeiro, foi a filosofia a questionar
tais teologias com base em narrativas mitológicas. Como havia muitas
explicações míticas para este mesmo tema, estudiosos passaram a desconfiar dos
mitos. Surgem os filósofos que procuravam explicações naturais para o mundo.
Este era chamado de cosmo que significava mundo organizado e racional. Por
isto, adicionaram o termo logos ao cosmo, resultou em cosmologia: o
conhecimento racional do mundo. O mito
perde espaço para a razão.
Modernamente foi a vez da ciência desafiar
os mitos. Antes do Big Bang, não existia matéria, tempo e espaço. Apenas o
Nada. Para física, não existe um Criador. O universo surgiu por si mesmo. É a
criação a partir do Nada. A física substantivou o pronome “nada”. A santíssima
trindade desta ciência é o espaço, o tempo e a matéria. A ciência tornou-se
existencial.
Há um propósito cósmico do universo. A
história é a execução de um plano até agora oculto da natureza que conduz a um
progresso moral e político da humanidade. A história universal tem um propósito
cosmopolita, como queria o filósofo Kant. O progresso da ciência está atrelado
a supremos interesses. A origem única convenceu as religiões, a ciência, a filosofia
e as artes. Tudo parece ter um começo, meio e fim. A vida registra o nascimento
de todos os homens. Depois, sua maioridade, casamento, divórcio. No fim, o
falecimento. Cidades, países, animais, rios, mares, tudo tem uma história como
início, meio e fim. Bom, muitos ainda não tiveram um “fim”, mas chegarão lá com
o tempo.
A diversidade do mundo natural tem origem
única que a tudo engloba. A essência da busca existencial é a convicção de que
tudo está interligado. Muitos cientistas advogam uma ordem por trás do aparente
caos. A ordem oculta permeia tudo. Esta busca uniria a mente de Deus com uma
teoria final. Há uma teoria física que propõe uma unificação do mundo material:
a Teoria de Tudo. Outra teoria se prontificou a dar suporte a teoria final: a
Teoria das Supercordas, são tubos submicroscópicos de energia que vibram. Porém,
mesmo que tal teoria confirme esta unificação, os impasses
científico-religiosos não vão permitir um consenso. Como alternativa a este
eterno confronto, nós apresentamos nossa abordagem.
O mundo metafísico sempre esteve presente
nas religiões sem limite de tempo espaço. Em todos os lugares, do aborígene na
Austrália as tribos indígenas da Amazônia, em todas as épocas, dos primitivos
humanos aos dias de hoje, o homem sempre uniu o mundo metafísico ao mundo
físico. É um fenômeno universal. A própria ciência dialoga com o metafísico,
pois para descrever suas pesquisas depende da linguagem, que é metafísica. Para
moldar quantitativamente suas pesquisas, utiliza a matemática, que também é metafísica.
A matemática e a linguagem, sendo metafísicas, também têm uma base metafísica,
a mente.
A ciência defende a vida e o universo como
produtos do acaso, do nada, da sorte, da coincidência. Não de um ato de
vontade. O universo surgiu por si mesmo. É a criação a partir do nada.
Cientificamente, podemos asseverar que viemos de uma explosão depois do nada.
Somos uma máquina biológica. O Sol irá aquecer a Terra e vida deixará de
existir. Em seguida, o universo vai perder energia e também extinguir. A vida e
o universo voltarão para o Nada. Numa frase: somos uma máquina biológica entre
dois nadas. Ah, a ciência existencialista oferece forças cegas em troca da fé
cega religiosa!
Esta divergência entre os pensamentos
religioso e científico é estéril. A matemática está em todas as ciências. Ela
não possui matéria-tempo-espaço, sendo assim metafísica por excelência, mas que
pode ser aplicada em toda realidade material. Igualmente, a linguagem é
metafísica. Neste sentido, a ciência é o estudo de um mundo físico em interação
com um mundo metafísico, igualmente as religiões.
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